Não creio que a esta altura possa dizer algo de Tolkien que já não tenha sido dito. Quando algo passa a ser somente um livro tornado fenônemo social começam a sair de debaixo das pedras os mais mordazes críticos e os mais exaltados admiradores.
Por sorte o verdadeiro juiz sempre é o tempo, e foi ele que se encarregou de elevar a obra do genial escritor até o mais alto degrau da escada da literatura universal. Com O Senhor dos Anéis, que o próprio Tolkien qualificou uma ocasião como "uma obra profundamente religiosa e católica", conseguiu que a magia do um anel passe de uma geração a outra como um tesouro familiar, nunca melhor dito.
Era de se esperar, então, que a trilogia cinematográfica nada mais fizesse a não ser ampliar a fascinação que muitos sentimos pela luta entre o bem e o mal que acontece na Terra Média, conseguindo assim contagiar com a febre tolkeniana muitas pessoas que desconheciam sua existência.
Também sua versão para PC e consoles, o que era lógico que acontecesse, conseguiu situar-se nos primeiros lugares das listas de vendas, ainda que apenas por estar baseada em um fenônemo tão grande como esse. Temos que reconhecer: tínhamos um certo temor inicial de encontrar, como já aconteceu em algumas ocasiões, um jogo tecnicamente saliente, cuja jogabilidade o fizesse afundar como um bote cheio de rachaduras. Por sorte, estamos em posição de afirmar que este não é um desses casos.
Mas - isso sim - é preciso advertir que o jogo tem uma vocação totalmente orientada à ação que, sem nos fazer pensar muito, se limita a enfrentarmos legiões de inimigos como em um arcade clássico. Talvez nesse sentido pudessem ter aproveitado um pouco mais de um mundo tão rico como o que criado por Tolkien.
Ainda que no primeiro nível controlemos Gandalf, uma vez que o superemos podemos escolher o caminho que queremos seguir: do mago, do rei ou dos Hobbits, dividindo-se o jogo em três tramas paralelas que levarão para o mesmo lugar. Entre os personagens que podemos escolher, à parte os secretos, estão Gandalf, Frodo, Sam, Legolas, Gimli e Aragorn. Além de cada um ter suas características próprias, nós os fazemos ir subindo de nível à medida que jogamos com eles, o que fará com que consigamos mais habilidades e técnicas de combate.
O controle do jogo combina teclado e mouse com um número de teclas bastante grande, o qual pode parecer meio complicado no início e ao qual levaremos um tempo considerável para nos acostumarmos. A única coisa que pode nos dar um pouco de dor de cabeça é o sistema de câmeras, muito cômodo em algumas ocasiões e algo embaraçoso em outras, principalmente quando encontramos câmeras que se empenham em mostrar um plano frontal do personagem para que não saibamos muito bem até onde estamos indo.
Em relação à versão anterior, a interatividade foi reforçada, enchendo o jogo de barris, lanças, archotes, catapultas e demais objetos dos quais nos servimos para acabar com o inimigo. Nesse sentido, há certa dose de estratégia baseada principalmente no ato de examinar o ambiente buscando mecanismos que facilitem avançar através da densa nuvem de inimigos que enfrentamos.
Entre os pontos mais positivos do jogo está a ambientação. Ao seguir o argumento da trilogia dirigida por Peter Jackson, que se baseia, por sua vez, na obra do escritor J.R.R. Tolkien, dispõe de um complexo mundo de fantasia no qual mergulhamos sem muito esforço. De fato, a ambientação é tão boa que basta gostar dos jogos de ação para desfrutar deste, e não importa se você não viu os filmes ou se é a primeira vez na sua vida que você ouve falar de elfos ou anões.
Se você é daqueles que compraram o DVD dos dois filmes, este jogo é totalmente imprescindível para você. Além de estar repleto de seqüências do filme antes que ela chegue às salas dos cinemas, encontramos vários "ovos de páscoa" com coisas tão interessantes como entrevistas com os protagonistas da trilogia. Um autêntico luxo!
Em relação ao som, não nos resta outra coisa a não ser tirar o chapéu e fazer uma reverência. O jogo conta com parte da trilha sonora da trilogia cinematográfica, que para nós é uma das melhores jamais composta. Se a isso somamos o fato de estar traduzido e dublado para o espanhol(*), encontramos o modelo que deveriam seguir todas as distribuidoras na hora de lançar um jogo em nosso país. Algo utópico, eu sei. (* Na edição brasileira, o game tem legendas em português de Portugal)
Graficamente, é um prazer total para os sentidos. Além de contar com cenários e personagens muito deltalhados, todo o jogo, em si, está cheio de vida. Os inimigos atuam com lógica, ainda que seus ataques se baseiem na tática do "sou muito mais forte que você". Um exemplo disso: se há vários orcs brigando entre si, não lhe darão bola a menos que você os ataquemos ou cruze seu caminho. Cada inimigo tem uma missão e você só é um obstáculo a mais, não o centro do mundo.
Uma das coisas que os fãs pediram com mais insistência foi um modo multijogador cooperativo, e isso foi incluído. Considerando o gênero do jogo, isso era totalmente necessário. Assim, bem-vindo seja.
Resumindo: O Retorno do Rei é um arcade clássico com um aparato gráfico e sonoro sobressalente e uma jogabilidade que, sem estar a essa mesma altura, é suficientemente alta para nos mater grudados na frente do monitor durante muitas horas. Se você é um fã do Senhor dos Anéis, não pode deixá-lo escapar. E se não é, tampouco pode perdê-lo.
Aqui termina esta história, tal e qual chegou até nós desde o Sul: e depois da desaparição de Estrela da Tarde, nada mais é dito nesta análise a respeito dos dias antigos.
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